*Por Maria Rachel Coelho Pereira
No decorrer da semana recebi vários emails e telefonemas para uma orientação em quem votar. O que causou espanto foi a quantidade de colegas, professores universitários que ainda estavam indecisos. Mas isso é perfeitamente compreensível. A polarização do debate eleitoral nos mostra que os partidos e candidatos estão iguais. A diferença se limita à tentativa de mostrar quem resiste mais às denúncias. Não há propostas novas para reorientar os rumos nacionais. É como se todos os problemas do Brasil se resolvessem pela simples manutenção do caminho adotado e que criou a tragédia social em que vivemos. Os conceitos de esquerda e direita perderam significado, e os partidos perderam a identidade. Todos se misturaram e se assemelham.
A eleição é o momento de pensarmos adiante, principalmente no Brasil, que sempre pregou ser o país do futuro. Mas hoje, o que vemos é um debate em que o futuro parece não existir, ou ser uma mera continuação do presente. Nos discursos, não há diferença nas perspectivas de futuro. Não vemos solução para a desigualdade. Como estará o Brasil daqui a 20 anos, diante da Globalização? Como garantiremos oportunidades iguais a todos? Que modelo econômico adotaremos, capaz de assegurar sustentabilidade, respeito ao meio ambiente e proteção do nosso patrimônio natural para as gerações futuras? Como conseguiremos oferecer emprego a todos os adultos, num tempo de crescente automação? Infelizmente, o que vemos hoje é um debate preso às circunstâncias atuais. Precisamos de alguém que cuide do presente, mas que comece a construir a ponte que nos levará ao Brasil de amanhã. Precisamos de alguém que comece a desenhar um futuro diferente para o Brasil.
Do governo Lula e dos partidos que o apóiam, esperava-se uma mudança. Menos compromisso com o partido e com a carreira de pessoas, e mais com o País e o povo. Mas não é isso o que se vê. Na verdade, só mudaram uma palavra: de um programa emancipatório como o Bolsa-Escola adotaram um programa assistencialista como o Bolsa- Família. No mais, o espírito é o mesmo: a indiferença.Mas, em regra, é essa a postura política brasileira. Governa-se para ficar bem na opinião pública e não para que o país fique bem na história. Parece que tem dado certo pela quantidade de candidatos que fizeram questão de usar a imagem do Presidente da República na campanha eleitoral. O que importa é a queda na popularidade. As crianças são irrelevantes se a imagem do governo estiver bem. Elas não votam.
Há anos, somos um País de escândalos de corrupção. Nos jornais, as páginas de política parecem com as de polícia. No meio de tantas denúncias, em pleno século XXI, depois de seis anos de um governo eleito pela esquerda, estatística do IBGE demonstra que o Brasil tem 2,4 milhões de analfabetos com idade entre 7 e 14 anos, dos quais 2,1 milhões (87,2%) frequentam a escola ( Jornal O Globo, 25 de setembro de 2008). Isso também é um escândalo, mas ninguém propõe uma CPI para investigar isso. Também não aparecem as crianças escondidas pelo manto da miséria, da exclusão e da discriminação, às quais são negados os direitos mais básicos, inclusive o direito ao registro civil, à condição de cidadão. Sem nome, sem registro, sem infância e sem futuro, que deixam de figurar nas estatísticas oficiais e perdem espaço nos programas oficiais, que deveriam ser desenhados justamente para atendê-las.
Nossas políticas públicas continuam ignorando milhões de crianças, privando-as da chance de um futuro digno. Talvez porque ninguém relacione, de forma inequívoca, infância e progresso. Talvez não percebamos que comprometer o desenvolvimento das crianças é comprometer nosso desenvolvimento. Não há futuro para um país que não cria suas crianças de forma digna e decente. Precisamos tirar nossas crianças das ruas, do trabalho, da prostituição infantil e colocá-las em escolas bonitas e bem equipadas, em horário integral, com professores muito bem remunerados, garantir a todas elas escolas com a mesma qualidade. Precisamos acreditar que isso é possível. Porque perdemos a capacidade de acreditar, nos acostumamos tanto com escolas ruins e desiguais que soa utópico, falta de bom senso, defender que todas as escolas sejam de qualidade, e que a escola do pobre seja igual à do rico. No dia do aniversário de 20 anos de nossa Constituição, nada temos a comemorar enquanto não a cumprirmos. Ou educamos todos, ou não teremos futuro. Ou o Brasil se educa ou fracassa; ou educamos todos, ou a desigualdade continua; ou desenvolvemos um potencial científico-tecnológico, ou ficamos para trás.
A revolução de hoje é a da distribuição do conhecimento. E conhecimento só se distribui com o acesso a uma escola com a mesma qualidade para os filhos dos pobres e para os filhos dos ricos. E escolas tão boas quanto aquelas dos países que já fizeram a revolução educacional, muitas décadas atrás. Isso só será possível melhorando o salário do professor, suas condições de trabalho, sua dedicação ao trabalho, sua formação, seu acesso a bons equipamentos. Mas para isso, é preciso que, apesar das disputas partidárias, forças políticas se unam e se comprometam em torno desse ideal, ao longo de muitos anos, mesmo com alternância no poder. Ele exige uma aliança entre lideranças políticas, partidos e pessoas de esquerda e de direita . Hoje existe um projeto de futuro, embora ainda pareça desligado do presente. Como um sonho desvinculado da realidade. Uma revolução feita com lápis e computadores e ainda existem políticos, em todos os partidos interessados pelo rumo do Brasil, embora a maioria só faça política e considere esse problema uma situação natural, irrelevante que se resolverá automaticamente nas próximas décadas.
Começa a crescer no Brasil, “militantes” e não só “filiados” dispostos a enfrentar esse problema social seriamente, por meio de políticas sociais eficientes, dando prioridade a educação e que sabem que essas políticas devem ser iniciadas imediatamente, com responsabilidade. São os Educacionistas. O Rio precisa de um Prefeito Educacionista, e isso independe de partido, o Brasil precisa de mais Educacionistas, como já precisou dos Abolicionistas. Para juntos fazermos a revolução pela educação. Superarmos a tragédia da exclusão, educando a todos, derrubando o muro da desigualdade e desenhando efetivamente um Estado Democrático de Direito.
3 comentários:
Professora
Parabéns pelo trabalho, melhor que muito parlamentar que está por aí, por aí...
bjs
Paulo César de Almeida
Você é brilhante.
Não existe palavra para te defenir, Rachel.
Você é simplesmente a Rachel!
Tarcísio
seu coordenador eterno
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